Existe uma possível forma de encontro entre o
teatro e as crianças, possivelmente, pelas suas “cem linguagens”, das quais
fala Malaguzzi (1999). O pedagogo anuncia em seu poema as formas ampliadas e
complexas que as crianças utilizam para compreender e estar no mundo.
A criança é feita de cem.
A criança tem cem mãos,
cem pensamentos,
cem modos de pensar, de jogar e de falar.
Cem, sempre cem modos de escutar as maravilhas de amar.
Cem alegrias para cantar e compreender.
Cem mundos para descobrir. Cem mundos para inventar.
Cem mundos para sonhar.
A criança tem cem linguagens (e depois, cem, cem, cem), mas roubaram-lhe
noventa e nove.
A escola e a cultura separam-lhe a cabeça do corpo.
Dizem-lhe: de pensar sem as mãos, de fazer sem a cabeça, de escutar e de não
falar, de compreender sem alegrias, de amar e maravilhar-se só na Páscoa e no
Natal.
Dizem-lhe: de descobrir o mundo que já existe e de cem, roubaram-lhe noventa e
nove. Dizem-lhe: que o jogo e o trabalho, a realidade e a fantasia, a ciência e
a imaginação, o céu e a terra, a razão e o sonho, são coisas que não estão
juntas.
Dizem-lhe: que as cem não existem.
A criança diz: ao contrário, as cem existem (MALAGUZZI, 1999, p.97).
Utilizei esse Plano de aula da Nova Escola para aplicar o teatro para as crianças na escola:
O que fazer antes?
Contextos prévios:
Para desenvolver a proposta,
será necessária a gravação antecipada de um áudio, no qual esteja narrado o
conto de fadas escolhido no plano Nossa peça teatral: Definindo o conto de fadas. É bem
interessante oferecer às crianças uma narrativa feita por você, mas existem
gravações disponíveis na internet, como a coleção Disquinho (A Bela e a
Fera), que traz várias histórias contadas, prontas para usar. A escolha do
conto a ser encenado será realizada pelas crianças, mas nesta sequência
utilizaremos como exemplo o conto A Bela e Fera, favorecendo a sua compreensão
do processo de intervenções junto às crianças. Você irá reorganizar o
planejamento a partir do conto escolhido por seu grupo.
Este plano faz parte de uma
sequência de cinco. São eles:
Nossa peça teatral: Definindo o conto de fadas
Nossa peça teatral: Descrevendo personagens e cenários
Nossa peça teatral: cenário, figurino e sonoplastia
Nossa peça teatral: O roteiro e falas das personagens
Nossa peça teatral: Ensaiar, convidar, apresentar
Materiais:
Áudio gravado pelo professor
ou de plataformas da internet (disponível no YouTube e no Spotify) que
apresentem a narração do conto de fadas escolhido pelas crianças. Celular ou
gravador de voz. Folhas de papel A3, cartolina ou outro, conforme a
disponibilidade da escola. Lápis grafite, borracha, giz de cera, lápis de cor e
canetinhas.
Cartolina ou papel pardo
para cartaz. Pincéis atômicos.
Caixas com fantasias,
tecidos e acessórios, para brincadeiras espontâneas. Acrescente, se possível,
elementos novos aos utilizados no Plano 1, como algumas caixas de papelão, fantasias,
fantoches ou máscaras de outros personagens, podendo ser do próprio conto que
as crianças irão teatralizar (conforme disponibilidade de sua escola)
Espaços:
A atividade ocorrerá na
própria sala do grupo, organizada de forma aconchegante. As crianças precisam
ficar bem acomodadas para ouvir com atenção ao áudio do conto de fadas. Em um
canto da sala disponha as caixas com materiais para brincadeiras de teatro já
utilizados no Plano 1 desta sequência.
Tempo sugerido:
Aproximadamente uma hora e
15 minutos.
Perguntas para guiar suas
observações:
1. Neste segundo contato com
o conto (durante a sequência), agora em áudio, quais demonstrações as crianças
dão sobre sua compreensão do enredo da história, que podem as auxiliar na
definição de personagens e cenários?
2. Que expressões,
movimentos e gestos as crianças utilizam para relatar as emoções manifestadas
pelas personagens e suas características?
3. Como as crianças se
organizam nos trabalhos em pequenos grupos, expondo suas ideias e considerando
as dos colegas para descrever os cenários e personagens para a montagem da peça
teatral?
Para incluir todos:
Identifique barreiras
físicas, comunicacionais ou relacionais que podem impedir que uma criança ou o
grupo participe e aprenda. Reflita e proponha apoios para atender às necessidades
e àd diferenças de cada criança.
A proposta de teatro traz
elementos motivadores que envolvem e despertam nas crianças o desejo de
interagir com os acontecimentos à sua volta.Mas pode ocorrer de uma ou mais
crianças sinalizarem desinteresse pela proposta dos pequenos grupos,
nesses casos, convide-as para serem seus ajudantes na gravação dos áudios, na
distribuição de materiais ou em outras ações, envolvendo-as de maneira
produtiva durante a atividade. Para garantir o entendimento do conto de fadas
por toda a turma, é fundamental fazer a utilização do livro, com texto e
imagens, além do recurso em áudio.
O que fazer durante?
1 Com as crianças em roda,
no grande grupo, próximas ao painel onde está fixado o roteiro de
atividades, elaborado no plano Nossa peça teatral: Definindo o conto de fadas, retome com
a turma os passos que foram definidos no roteiro. Compartilhe que agora é o
momento de vocês explorarem um pouco mais as personagens e os cenários da
história. Comunique ao grupo que para isso você irá oferecer uma outra versão
do conto, desta vez, por meio de um áudio que foi especialmente gravado por
você (ou de versões disponíveis na internet, se for o caso).
Como as crianças já conhecem
o conto de fadas, favoreça que elas compartilhem do que se lembram sobre locais
(cenários) onde a história acontece e quais são as personagens do conto de
fadas. Por exemplo, sendo o conto A Bela e a Fera, permita que falem do lugar
em que a família de Bela morava, por onde o pai dela viajou, onde ela morou com
a Fera etc.
2 Proponha às crianças que,
ao ouvirem o áudio da história, prestem atenção aos momentos que tratam dos
locais onde a história acontece e que notem quando é possível entender que a
narrativa mudou de espaço. Solicite a atenção também para como a história é
contada, se o narrador fala mais rápido ou mais pausado, e em que situações
elas percebem isso.
Diga que para montarem a
peça teatral elas precisarão saber bem como são as personagens, por isso, é
importante que prestem atenção ao que o narrador fala sobre elas e nos diálogos
que ocorrem, como são suas vozes, o que nos fazem sentir etc. Combine que os
pequenos vão ouvir uma vez a história toda com bastante atenção para perceber
todos esses detalhes e que, na segunda vez, vocês farão paradas para irem
registrando as informações sobre cenários e personagens da história.
Acomodem-se para ouvir o áudio da história.
3 Após as crianças terem
ouvido a contação da história uma vez, convide o grande grupo para se
acomodar próximo ao quadro, onde estará previamente fixada uma cartolina ou uma
folha de papel pardo, para o registro dos cenários em que ocorrem a história e
de quem são as personagens. Combine que você repetirá o aúdio para que todos
apontem observações. Diga que, para isso, será preciso que levantem a mão para
sinalizar que têm algo a comentar. É importante que você já programe quais são
as pausas pois, caso as crianças não percebam, você pode fazer a pausa e trazer
alguma provocação que as apoiem na identificação de quando acontecem mudanças
de local na história e de quando as personagens que vão surgindo no enredo.
Enquanto elas falam, você faz o registro do que está sendo destacado no conto.
Neste momento é essencial que vocês levantem todos os locais (cenários) por
onde se passa a história e o nome das personagens. A caracterização deles se
dará nas etapas seguintes, nos pequenos grupos.
4 Depois do registro
proponha um diálogo sobre o que mais precisam saber sobre os cenários e as
personagens da história para que montem a apresentação teatral. Sugira que se
organizem em pequenos grupos, conforme suas preferências, combinando que
alguns grupos vão descrever as personagens e outros os cenários. Para essa
descrição você pode oferecer duas estratégias: gravação de áudios, nos quais as
crianças descreverão oralmente as personagens e cenários, ou desenhos em folhas
de papel, nos quais serão representados as personagens e cenários. Os pequenos
podem também ouvir novamente o áudio do conto de fadas, nos grupos, parando quando
necessário. Disponha o livro da história, utilizado no Plano 1, e também de outros contos (se tiver disponível),
pois existem várias versões e traduções de uma mesma história.
Caso você tenha a
possibilidade de estar junto com um outro professor, combine com ele que cada
um pode apoiar alguns pequenos grupos, por exemplo, um professor fica
responsável por pequenos grupos que estão trabalhando nos cenários e
o outros por equipes que estão trabalhando com os personagens. Caso você não
tenha essa possibilidade, combine com a turma que a partir das escolhas dos
grupos vocês farão a atividade em dois momentos, para que você possa apoiar a
todos. Proponha que enquanto os pequenos grupos de personagens
trabalham com seu apoio, as demais crianças possam se envolver com uma
brincadeira de teatro, utilizando os materiais das caixas, ou desenvolver
alguma outra atividade que ele fazem com autonomia e que você julgar
significativa ao grupo. Explique a todos que depois de 20 minutos haverá uma
troca: as crianças que trabalharam em pequenos grupos sobre os
personagens vão participar da atividade autônoma e você passará apoiar os que
trabalharão com os cenários. Deixe claro às crianças como se dará essa dinâmica
de organização e trabalho nos pequenos grupos.
5
Em cada pequeno
grupo, as crianças definirão quais estratégias vão utilizar para descrever
personagens e cenários. De acordo com o que for escolhido (gravação em áudio ou
desenho), junto com as crianças, busque os materiais que você deixou
previamente separado e combinem como farão o registro. Se elas decidirem que
vão gravar as descrições em áudio, questione quem fará essa gravação. Se elas
optarem por desenhar, pergunte se cada criança fará de um cenário, por exemplo,
ou se elas farão de alguma outra forma. Após os combinados, instigue as
crianças a falar um pouco mais sobre cada local em que se passa a história (ou
sobre características das personagens, para os grupos que estiverem com essa
atribuição). Nessa troca elas vão expondo suas visões, que podem ser
diferentes, e definirão como compor a peça teatral do grupo.
Percebendo que as crianças
não abstraíram ainda muitos elementos dos cenários ou as características das
personagens, proponha que escutem novamente o áudio ou que vejam os livros da
história.
6
No momento do registro,
especialmente se for em áudio, auxilie as crianças, no pequeno
grupo, no manuseio do celular ou do gravador de voz. Em seguida, proponha
que ouçam o que foi gravado, para analisarem se precisam refazer algum trecho
ou se faltam alguns detalhes na descrição.
Se estiverem registrando as
características por meio de desenhos, sugira que complementem-nos com escrita
espontânea, por exemplo, com algumas falas das personagens. Se elas preferirem,
seja o escriba, registrando o que trazem nesse momento.
Questione os grupos do
cenário a respeito dos elementos e objetos que possam ter nos locais, pois as
crianças precisarão considerar essas coisas na montagem da peça teatral. Por
exemplo, no jardim do castelo (A Bela e a Fera), há flores e passarinhos. Na
casa da família da Bela se passam cenas diferentes, no portão, no quarto do
pai. Há um destaque para espelho no castelo da Fera etc.
Para os grupos das
personagens, além de falar sobre características gerais da Bela, que é linda e
canta docemente, e da Fera, que é muito grande e feia; as crianças podem
descrever e reproduzir alguns diálogos. Chame atenção delas para o narrador,
elemento recorrente nos contos de fadas e essencial para a compreensão do
enredo da história.
Para finalizar: Convide as
crianças para ver os desenhos e ouvir os áudios dos colegas, dialogando no
grande grupo sobre o que cada pequeno grupodescreveu a respeito das personagens
e dos cenários.Se não for possível neste momento, devido à rotina do dia, combine
que vocês retomarão esses materiais para que as crianças os complementem com as
sugestões dadas pelos colegas. Solicite ajuda delas para organizar a sala e
para guardar nas caixas os materiais utilizados para a brincadeira teatral, bem
como os materiais de registro.
Desdobramentos
As crianças normalmente
gostam muito de gravar as próprias vozes e esta proposta de encenação favorece
esse recurso. Em outros momentos, elas podem imitar a voz das personagens,
gravar algumas falas, fazer o papel do narrador etc. Isso pode ajudá-las na
hora em que precisarem definir quem fará o papel de cada personagem e do
narrador. Ao realizar essa atividade, certo modo, elas já estarão fazendo
pequenos ensaios.
Engajando as famílias
O celular é um recurso do
cotidiano de quase todas as famílias, assim, se você administra um grupo de
Whatsapp dos familiares da turma, aproveite para, junto com as crianças, contar
sobre o que vocês descobriram sobre os cenários ou os personagens do conto de
fadas que vão representar e para solicitar que os pequenos, junto com seus
responsáveis, gravem áudios curtos. Eles podem fazer o papel do narrador,
descrevendo algum local da história ou algum personagem ou gravar os diálogos e
depois compartilhar a realização com a turma. Caso não seja possível, proponha
às crianças que recontem a história para alguém da família. Em seguida, o
familiar fará um desenho do conto de fadas para ser apresentado aos colegas no
dia seguinte.
Fonte: https://planosdeaula.novaescola.org.br/educacao-infantil/pre-escola/peca-teatral-descrevendo-personagens-e-cenarios/4103
Fonte: Paulo Sergio Fochi Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS (São Leopoldo – Brasil)
Fonte fotos: Cristiane Caldas
Fonte foto: Autorizaçao da mamãe Fabiana
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